DALVA DE OLIVEIRA QUE SERÁ Que Será Da Minha Vida Sem o Teu Amor Da Minha Boca Sem Os Beijos Teus Da Minha Alma Sem o Teu Calor Que Será Da Luz Difusa Do Abajour Lilás Se Nunca Mais Vier a Iluminar Outras Noites Iguais Procurar Uma Nova Ilusão Não Sei Outro Lar Não Quero Ter Além Daquele Que Sonhei Meu Amor Ninguém Seria Mais Feliz Que Eu Se Tu Voltasses a Gostar De Mim Se Teu Carinho Se Juntasse Ao Meu Eu Errei Mas Se Me Ouvires Me Darás Razão Foi o Ciúme Que Se Debruçou Sobre o Meu Coração
Chico Buarque - O Meu Amor O meu amor tem um jeito manso que é só seu E que me deixa louca quando me beija a boca A minha pele inteira fica arrepiada E me beija com calma e fundo Até minh'alma se sentir beijada, ai O meu amor tem um jeito manso que é só seu Que rouba os meus sentidos, viola os meus ouvidos Com tantos segredos lindos e indecentes Depois brinca comigo, ri do meu umbigo E me crava os dentes, ai Eu sou sua menina, viu? E ele é o meu rapaz Meu corpo é testemunha do bem que ele me faz O meu amor tem um jeito manso que é só seu De me deixar maluca quando me roça a nuca E quase me machuca com a barba malfeita E de pousar as coxas entre as minhas coxas Quando ele se deita, ai O meu amor tem um jeito manso que é só seu De me fazer rodeios, de me beijar os seios Me beijar o ventre e me deixar em brasa Desfruta do meu corpo como se o meu corpo Fosse a sua casa, ai Eu sou sua menina, viu? E ele é o meu rapaz Meu corpo é testemunha do bem que ele me faz
PEDAÇO DE MIM (CHICO BUARQUE) Oh, pedaço de mim Oh, metade afastada de mim Leva o teu olhar Que a saudade é o pior tormento É pior do que o esquecimento É pior do que se entrevar Oh, pedaço de mim Oh, metade exilada de mim Leva os teus sinais Que a saudade dói como um barco Que aos poucos descreve um arco E evita atracar no cais Oh, pedaço de mim Oh, metade arrancada de mim Leva o vulto teu Que a saudade é o revés de um parto A saudade é arrumar o quarto Do filho que já morreu Oh, pedaço de mim Oh, metade amputada de mim Leva o que há de ti Que a saudade dói latejada É assim como uma fisgada No membro que já perdi Oh, pedaço de mim Oh, metade adorada de mim Lava os olhos meus Que a saudade é o pior castigo E eu não quero levar comigo A mortalha do amor Adeus.
"O valor das coisas não está no tempo
em que elas duram, mas na intensidade
com que acontecem. Por isso existem
momentos inesquecíveis, coisas
inexplicáveis e pessoas incomparáveis."
* Fernando Pessoa
Houve um tempo em que a minha janela se abria para um chalé. Na ponta do chalé brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias límpidos, quando o céu ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusão maravilhosa, e sentia-me completamente feliz. Houve um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flôres. Para onde iam as flores? quem as comprava? em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existência? E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebê-las? Eu não era mais criança, porém minha alma ficava completamente feliz. Houve um tempo em que minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da árvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histórias. Eu não a podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que a ouvisse, não a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difícil. Mas as crianças tinham tal expressão no rosto, e às vêzes faziam com as mãos arabescos tão compreensíveis, que eu participava do auditório, imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz. Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um jardim quase seco. Era numa época de estiagem, da terra esfarelada,e o jardim parecia morto. Mas todas as manhãs vinha um pobre homem com um balde,e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sôbre as plantas. Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espêssas. Avisto crianças que vão para a escola. Pardais que pulam o muro. Gatos que abrem e fechamos olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho no ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes, um galo canta. Às vezes, um avião passa. Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. Eu me sinto completamente feliz. Mas quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.