domingo, 12 de setembro de 2021

đŸ‘€# CECILIA MEIRELES - A ARTE DE SER FELIZ




đŸ‘€# CECILIA MEIRELES - A ARTE DE SER FELIZ
 
 
A Arte de Ser Feliz... 
 
CecĂ­lia Meireles
 
(Quadrante, pĂĄg. 13-15, Editora do Autor, s/d)


Houve um tempo em que a minha janela se abria para um chalĂ©. Na ponta do chalĂ© brilhava um grande ovo de louça azul. Nesse ovo costumava pousar um pombo branco. Ora, nos dias lĂ­mpidos, quando o cĂ©u ficava da mesma cor do ovo de louça, o pombo parecia pousado no ar. Eu era criança, achava essa ilusĂŁo maravilhosa, e sentia-me completamente feliz. Houve um tempo em que a minha janela dava para um canal. No canal oscilava um barco. Um barco carregado de flĂŽres. Para onde iam as flores? quem as comprava? em que jarra, em que sala, diante de quem brilhariam, na sua breve existĂȘncia? E que mĂŁos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de alegria ao recebĂȘ-las? Eu nĂŁo era mais criança, porĂ©m minha alma ficava completamente feliz. Houve um tempo em que minha janela se abria para um terreiro, onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda. À sombra da ĂĄrvore, numa esteira, passava quase todo o dia sentada uma mulher, cercada de crianças. E contava histĂłrias. Eu nĂŁo a podia ouvir, da altura da janela; e mesmo que a ouvisse, nĂŁo a entenderia, porque isso foi muito longe, num idioma difĂ­cil. Mas as crianças tinham tal expressĂŁo no rosto, e Ă s vĂȘzes faziam com as mĂŁos arabescos tĂŁo compreensĂ­veis, que eu participava do auditĂłrio, imaginava os assuntos e suas peripĂ©cias e me sentia completamente feliz. Houve um tempo em que minha janela se abria sobre uma cidade que parecia ser feita de giz. Perto da janela havia um jardim quase seco. Era numa Ă©poca de estiagem, da terra esfarelada,e o jardim parecia morto. Mas todas as manhĂŁs vinha um pobre homem com um balde,e, em silĂȘncio, ia atirando com a mĂŁo umas gotas de ĂĄgua sĂŽbre as plantas. NĂŁo era uma rega: era uma espĂ©cie de aspersĂŁo ritual, para que o jardim nĂŁo morresse. E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de ĂĄgua que caĂ­am de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz. Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor. Outras vezes encontro nuvens espĂȘssas. Avisto crianças que vĂŁo para a escola. Pardais que pulam o muro. Gatos que abrem e fechamos olhos, sonhando com pardais. Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho no ar. Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega. Às vezes, um galo canta. Às vezes, um aviĂŁo passa. Tudo estĂĄ certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino. Eu me sinto completamente feliz. Mas quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estĂŁo diante de cada janela, uns dizem que essas coisas nĂŁo existem, outros que sĂł existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que Ă© preciso aprender a olhar, para poder vĂȘ-las assim.


 
 
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