terça-feira, 19 de abril de 2005

đŸ‘€# CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - E AGORA JOSE



đŸ‘€# CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - E AGORA JOSE
 
 
E AGORA JOSÉ
Carlos Drummond de Andrade

04/02/2005



E agora, José?

A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, vocĂȘ?
vocĂȘ que Ă© sem nome,
que zomba dos outros,
vocĂȘ que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?


EstĂĄ sem mulher,

estĂĄ sem carinho,
estĂĄ sem discurso,
estĂĄ sem carinho,
jĂĄ nĂŁo pode beber,
jĂĄ nĂŁo pode fumar,
cuspir jĂĄ nĂŁo pode,
a noite esfriou,
o dia nĂŁo veio,
o bonde nĂŁo veio,
o riso nĂŁo veio
nĂŁo veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?


E agora, José?

Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerĂȘncia,
seu Ăłdio - e agora?


Com a chave na mĂŁo

quer abrir a porta,
nĂŁo existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas nĂŁo hĂĄ mais.
José, e agora?


Se vocĂȘ gritasse,

se vocĂȘ gemesse,
se vocĂȘ tocasse
a valsa vienense,
se vocĂȘ dormisse,
se vocĂȘ cansasse,
se vocĂȘ morresse...
Mas vocĂȘ nĂŁo morre,
vocĂȘ Ă© duro, JosĂ©!


Sozinho no escuro

qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
vocĂȘ marcha, JosĂ©!
José, para onde?
 
 
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